quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Tese do Centro de Estudantes de Letras o CEUfrgs

A Letras como ela é

            Sabe aqueles textos que te causam uma sensação de identificação com as personagens? Que parecem ter sido escritos por alguém que te conhece muito bem, que sabe o que se passa na tua vida? Afirmamos, este com certeza é um desses! E de fato foi escrito por quem conhece a tua realidade. Com personagens fictícios, mas baseado em uma história real, que é a nossa, esta é a tese do curso de Letras para o V Congresso de Estudantes da UFRGS, queremos convidá-l@ a realizar uma prazerosa leitura para além das disciplinas do nosso curso. Aqui temos uma analogia entre a ficção e a vida social, que esperamos ser capaz de colocar na ordem do dia a possibilidade do estudante de Letras mudar o curso dos acontecimentos. Boa leitura!

A biblioteca de Capitulina
            Capitulina é estudante de Letras, entrou na UFRGS no semestre passado. Desde então, gasta mais de 10 reais por semana em xerox. Sempre que é possível, utiliza a biblioteca, mas geralmente não consegue os livros básicos requisitados pelos professores para turmas de mais de 40 alunos. Quando precisa fazer trabalho em grupo, não encontra espaço na biblioteca do Vale, pois as salas sempre estão ocupadas; assim, precisa encontrar horários alternativos. Mas a biblioteca não abre à noite, e Capitulina trabalha à tarde...
            Esses são nossos problemas quanto à biblioteca: o acervo não é suficiente, o espaço físico não dá conta da demanda, e não sabemos quem de fato requisita as obras adquiridas, muito menos quanto é a verba destinada à biblioteca e como ela é aplicada.
            Na última reunião com a reitoria, foi apresentado um projeto de biblioteca única do Campus do Vale, o qual será desenvolvido pelo diretor do IFCH e pela diretora da Letras. Mas de concreto, não tivemos resposta alguma: nem prazo, nem projeto, nem levantamento de dados com alunos, técnicos e professores sobre o que esses querem para suas bibliotecas. Quem vai decidir tudo isso? Sem prazo, nem verba garantida, quando veremos essa biblioteca ser construída?

Peri e acessibilidade
            Peri é deficiente físico e enfrentou dificuldades pra se locomover desde a pré-escola. Hoje, está na UFRGS, onde continua enfrentando os mesmo problemas: não há elevadores, portas, banheiros adequados, nem rampas para os cadeirantes. E as dificuldades de quem tem necessidades especiais, não para por aí: não há quadros brancos para os portadores de daltonismo nem pisos táteis para os estudantes com deficiência visual mais severa.
            Nós acreditamos que não se pode deixar de suprir as demandas desses estudantes, pois eles tem tanto direito quanto todos os outros de ter qualidade no seu aprendizado. Os estudantes com deficiência tem necessidades particulares que geralmente não são atendidas, o que compromete sua permanência na Universidade.
            Hoje, o Projeto Incluir, que é responsável por suprir as necessidades mais básicas dos estudantes com deficiência, tem pouca infraestrutura e pouco investimento, o que impede que seu trabalho alcance um desempenho satisfatório para todos os que necessitam dele.
            Você já se perguntou por que tão poucos estudantes com deficiência chegam a essa Universidade? Esses estudantes, além de terem dificuldades oriundas da própria deficiência, vêm majoritariamente das classes mais baixas, que são as que tem o acesso à saúde e à higiene mais precarizados. São esses mesmos estudantes que vivem o sucateamento da educação básica pública, que já os expulsa muitos anos antes do sistema de ensino. Por isso, defendemos a implementação de cotas para estudantes com deficiência, como já existe em outras universidades federais como a UFPR e a UFBA e estaduais como a UERGS.

Naziazeno e as bolsas administrativas
            Naziazeno faz o curso de licenciatura em Letras pela manhã e trabalha em uma secretaria da universidade atendendo o telefone e tirando cópias todas as tardes. Para deixar cadeiras para trás, para deixar de estudar e de produzir conhecimento, para não ter férias, e, sobretudo, para conseguir manter seus gastos com os estudos, Naziazeno recebe 360 reais.
            Um aluno de graduação trabalhando no lugar de um funcionário público é menos um emprego para a comunidade metropolitana. É um aluno com o rendimento comprometido, já que para ter uma bolsa SAE são necessárias 20 horas livres em sua semana e sabemos que isso significa cadeiras que ficaram para trás (pois a maioria dos cursos da universidade tem cadeiras em todos os turnos) e também muito estudo que deveria ser realizado fora da sala de aula.
            Aparentemente, um bolsista administrativo é uma aquisição vantajosa para a UFRGS, em decorrência de se ter alguém que faça praticamente a mesma função de um técnico administrativo, só que por um salário bem menor e sem direito a todos os benefícios que constam na lei, inclusive o de se afastar por doença? Mais do que trabalhar de forma mais barata por um técnico-administrativo, o bolsista não tem direito a recesso, nem mesmo nos períodos de menor atividade da universidade (entre semestres), também não tem direito de ter seu horário de trabalho reduzido no período de provas no final do semestre. Nessas condições, onde está a vantagem para a formação de um aluno de graduação?
            Esse problema está diretamente relacionado ao financiamento da universidade. Os cursos que recebem pouco dinheiro da instituição e nenhum dinheiro de fora (as licenciaturas em geral aí se incluem) contam com poucas pesquisas e ações de extensão; isso faz com que aqueles alunos que de fato precisam da bolsa permanência tenham de se reduzir a esse tipo de trabalho, que, em geral, são absolutamente alheios a sua formação acadêmica.
            Nós achamos que um aluno da UFRGS deve retribuir a sociedade que custeia seus estudos com outra forma de produção. Por isso, toda a bolsa deve ser de extensão ou de pesquisa, para propiciar uma produção que de fato esteja ligada a sua formação acadêmica, que de fato faça parte do processo de aquisição de conhecimento, e, sobretudo, que as ações de ensino, pesquisa e extensão sejam financiadas com verba pública e voltadas para a população – não para o mercado.

Ana Terra e o curso noturno
            Ana Terra gostaria de ser tradutora. No entanto, ela tem uma filhinha, e, para se manter, precisa trabalhar 8 horas por dia – afinal, a bolsa permanência não chega nem perto de suprir suas necessidades. Infelizmente, Ana Terra desistiu do curso. A carga horária e a inexistência da possibilidade de estudar no turno da noite contribuíram especialmente para isso.
           
Essa é a situação atual no curso de Letras: quem precisa trabalhar em empregos que tomam a maior parte do período diurno fica impossibilitados de cursar letras na UFRGS.
            Para implementar os cursos de licenciatura e de bacharelado em Letras na modalidade noturna, algumas mudanças no atual currículo seriam necessárias: em primeiro lugar o currículo noturno não poderia exigir mais do que 20 créditos obrigatórios por semestre. Na verdade, acreditamos que nem mesmo a modalidade diurna deva exigir uma carga horária maior do que essa.
            Outra mudança curricular essencial é a de que haja maior regularidade no sistema de avaliações das disciplinas. Até onde se sabe, fica a critério do professor da disciplina determinar o número de avaliações que serão realizadas no decorrer do semestre, assim, existem professores que realizam apenas uma avaliação final e outros que no decorrer do semestre realizam até cinco avaliações. Dessa forma, o aluno não sabe o que esperar das disciplinas até que já esteja matriculado e tenham iniciadas as aulas, nem  sempre recebendo de seu professor o conteúdo programático da disciplina.

Personagens que sofrem para além das letras
            As histórias de Capitulina, Peri, Naziazeno e Ana Terra estão parecendo ficção? Em realidade, é isso que enfrentam diariamente centenas de alunos da UFRGS e de outras universidades. No fundo, todos esses problemas são perpassados por duas questões que se evidenciam quando refletimos um pouco mais sobre eles: o financiamento da educação e a democracia nas decisões dentro das universidades.
            Nesse sentido, o espaço para dar nosso testemunho de como a falta de investimento na educação nos tem prejudicado e como pensamos ser urgente a mudança é fundamental. E só juntos e mobilizados é que essas mudanças acontecem! Queremos mais investimento na educação já!

*Por cursos noturnos

*Por cursos organizados em 20 créditos por semestre

*Pela elaboração de um projeto de biblioteca do Vale elaborado por estudantes, técnicos e professores de forma paritária

*Pela ampliação do acervo da biblioteca

*Por uma administração democrática da biblioteca

*Investimento em estrutura e apoio para todo tipo de necessidade especial

*Ampliação imediata do Projeto incluir

*Cotas para deficientes

*Por bolsas de ensino, pesquisa e extensão para todos os estudantes

*Que as bolsas administrativas sejam extintas, e se realizem concursos públicos para suprir a demanda de técnicos

*Por investimento público em projetos de ensino, pesquisa e extensão

* 10 % do PIB pra educação já: nós não podemos mais esperar
!

Centro de Estudantes de Letras – Gestão Cultura&Consciência

Nenhum comentário:

Postar um comentário